Aprender com os próprios erros é, sem dúvida, uma maneira “agridoce” de crescer, evoluir, ler nas linhas e entrelinhas da vida. Da nossa vida. Aquela que muitas vezes ( senão sempre) só faz sentido para nós. Por vezes esquecemos e esperamos que os outros nos entendam. Queremos, não sendo transparentes, que os outros nos vejam com transparência. Queremos, não sendo julgados, que nos aceitem ( quando isso na realidade não deveria ser uma necessidade nossa). E por vezes depressa nos esquecemos ( por mais sensíveis e iluminados que sejamos) que também não devemos julgar, que cada pessoa é um mundo e infinitas as razões e complexidades para alguém ser como é. Ou como já foi e renasceu. Ou como quer ser, mesmo que isso lhe custe vender a alma ( ao Diabo ou a outro ser mitológico qualquer). Quando estamos nós próprios a sofrer, tudo é sobre nós. Parece que todas as mensagens e sinais são indirectas. “Néons” fosforescentes a piscar-nos à frente dos olhos, a acusar-nos de que temos de reagir, que temos de arriscar, de perdoar,de enfrentar, de esquecer. E nessas alturas as pessoas que mais nos incomodam são aquelas que nos fazem precisamente lembrar de nós e dos nossos erros. Ou defeitos. Reflexos do que nos envergonha em nós, do que não ousamos admitir. Irrita-nos o nosso próprio defeito espelhado nos outros. Porque lutamos contra ele e não encontramos compreensão para aceitar noutra pessoa aquilo que mal suportamos em nós. Há já uns bons anos que digo ( às vezes até tento explicar, muitas vezes sem sucesso) que parte das minhas lições coleccionei-as a partir da experiência dos outros. Gosto de escutar os outros. De os observar. De me imaginar no seu lugar. De os admirar. Ou de, pelo menos, entender. Não é fácil. Lamber as próprias feridas é um processo lento mas, a cada dia que passa e após uma noite de sono ( sempre que possível), aprendi a ver (quase) sempre o lado bom do lado mau. A reciclar, apurar e ficar só com o ensinamento. Imaginar as dores dos outros ( por afinidade ou sensibilidade) não é tarefa fácil. Resta-nos o respeito que ganhamos pelas pessoas, a capacidade que temos de antecipar comportamentos, a bênção de as conhecer como seres que trazem momentos marcantes às nossas vidas, a gratidão de ter interagido com elas, por minutos, horas, dias, semanas… é curioso como às vezes a vida nos quer fazer avançar para outra maneira de a olhar e, para tal, usa uma espécie de mecanismo de emergência. Aprende-se às vezes com uma conversa de horas o mesmo do que em anos de convívio. Às vezes algo aparentemente insignificante para o outro revela-se tão claro e certo como um “insight” que só nos resta guardar essa espécie de “medalha” fulminante só para nós, pois explicando, nem mesmo essa pessoa que foi o veículo dessa lição entenderia. Porque o seu mundo permaneceu igual. Quem mudou fomos nós. As pessoas tocam-nos e tocamos as pessoas sem nos apercebermos. E isso…é uma grande responsabilidade. Não só com a família, não só com amigos, com colegas…é grande com qualquer estranho que por um tempo incerto e por razões que nem vale a pena tentarmos explicar de forma lógica e racional, nos entram pela porta de casa ou encontramos numa rua qualquer do nosso quotidiano ou até no mundo virtual da grande WWW. Por isso é tão importante estar de olhos sempre abertos. Ver mais além. Perceber que há sempre uma razão para alguém ou algo se cruzar no nosso caminho. Existem dias em que me entristece não encontrar mais pessoas que partilhem este olhar. Entristece e é cansativo. Ter de explicar que é uma questão de perspectiva. Que nada é finito ou definitivo. Nada tem somente uma explicação. Até as definições dos dicionários sofrem revisões e acréscimos. Actualizações. Como na vida. Não interessa a definição que tínhamos como verdadeira e definitiva aos oito ou aos dezasseis ou aos vinte e três ou aos trinta e cinco anos de idade. Interessa é não ter medo de actualizar o nosso olhar e perder o receio de mudar. Admitir que a opinião, postura, atitude muda-se a cada dia que passa. E isso não é ser incoerente. Isso é saber mais hoje do que ontem e menos do que amanhã.
Aceitemos cada pessoa como é. E não a comparemos constantemente connosco ou com o nosso percurso de vida. Cada um tem as suas razões para ser mais ou menos livre do que nós. Mais ou menos corajoso, ambicioso, egoísta, materialista, solitário, promíscuo, arrogante, “sortudo”… Sim, não foi por acaso que deixei o “sortudo” para último. Ninguém nasce por magia com o “traseiro virado para a Lua” como se costuma dizer. Mas há esta tendência intrínseca e masoquista de achar que os outros vivem melhor que nós, têm mais amor que nós, etc. Como se fossemos filhos de um “Deus menor”. Que nos abandonou ou esqueceu ou nos deixou em “stand by”. A verdade é que não importa se é uma ilusão. Podemos até conhecer alguém com um nível de felicidade extraordinário. Nesse caso devemos aproveitar. As pessoas felizes são altruístas. Querem partilhar. Querem dividir com os outros o que lhes vai na alma porque a alma feliz pula e ri e é possuída por um encantamento contagioso. Eis a principal diferença entre estas e os meros exibicionistas. E temos de ficar também felizes por essa conquista. Felizes pelo outro. Sem nenhum tipo de inveja mesquinha que alguns insistem em sentir ( e que funciona como veneno para o próprio corpo), como vampiros a sugar a alegria alheia, cuspindo sentenças e criticando aquilo que cai fora da sua zona de conforto e toca bem no centro da sua ferida. Esse incómodo que é não conseguir que todos sofram da mesma infelicidade, como quem( por revolta) espalha um vírus anónimo e fatal. Sofremos! De uma forma ou de outra sofremos porque a própria energia negativa por si só é viral. A maneira como convivemos com isto, como somo mais ou menos imunes e como nos auto-curamos é que faz toda a diferença. Portanto… não queiramos que choremos todos o mesmo fado, por solidariedade. Não tentemos destruir o que os outros alcançaram. Não nos achemos donos da verdade, especialmente dando conselhos a quem não os pediu. Existe uma altura certa para tudo e muitas vezes o que é cura para nós é tóxico para o outro. Às vezes não procuramos dissecar a ferida porque ela ainda dói mais. Façamos mais vezes silencio e companhia. Escutemos desabafos, alegrias e tristezas, entusiasmos e euforias com o coração aberto e sem filtros. Tenhamos a capacidade de rir e chorar, de dar um abraço ou um beijo. De dizer ” gosto muito de ti” ou ” gosto de ti exactamente como és” ou ” eu não sei o que dizer, mas entendo e estou aqui para o que der e vier” ou um simples “fico feliz por ti”. Sinceros. Autênticos. Com empatia. Empatia é muito diferente de simpatia. Quando a vossa boca fugir para um ” isso não é nada, havias de ver o que me aconteceu” ou um ” comigo foi ainda pior”…parem! Travem. Não sejam amargos. Não é uma competição. Adquiram a capacidade de rir e abstrair quando “a galinha do vizinho é mais gorda” porque podem ser … hormonas. Aquele casal que conhecem e que vive luxuosamente e parece que tudo lhe cai do céu? Pode já ter perdido outro tanto na vida. E ter conseguido reerguer-se. Ou pode estar cheio de dívidas enquanto toda a gente lhe inveja o sucesso. Pode matar-se a trabalhar e não ter vida própria e tempo de qualidade. Pode entupir-se de objectos e luxos e animais de estimação para preencher o vazio de nunca ter tido um filho… Aquela rapariga bem disposta que é vossa colega de trabalho e que diz que ama a vida, pode estar verdadeiramente apaixonada, após dezenas de decepções ou amores não correspondidos, pode ter ultrapassado uma doença complicada, pode estar em fase de negação e a tentar impressionar, mentindo a si própria, vivendo num mundo irreal até ao dia em que tiver coragem de enfrentar tudo. Aquela vizinha auto-suficiente e independente que afirma não precisar de ninguém, que não tem companheiro nem planeia ter, que diz jamais casar e que tem muito orgulho nisso; pode ter vivido anos numa espécie de cativeiro, a partilhar tempo e espaço com “alguém que não ouvia a mesma canção”, abdicado de liberdade e de sonhos, pode ter perdido um filho, pode ter tido um/a amante casado/a que durante anos lhe prometeu o impossível, alimentando o o coração de mentiras. No meio dessa multidão existem ou podem de fato existir as tais pessoas felizes. Mesmo felizes. Porque não? Porque não transformar cicatrizes em tatuagens e pintá-las com as nossas melhores cores. As que nós escolhemos com total liberdade?